Conhecido nos governos do PT como o banco dos campeões nacionais, o BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social) mudou de perfil nas gestões de Michel Temer e de Jair Bolsonaro. A partir da guinada na política econômica, o total de recursos emprestados diminuiu a quase um quinto: em 2010, a estatal emprestou R$ 294,8 bilhões, em valores atualizados, e, em 2020, R$ 65 bilhões. Com a redução de empréstimos, o foco agora é prestar serviços de projetos para infraestrutura, concessões e privatizações.
Durante as gestões de Luiz Inácio Lula da Silva e Dilma Rousseff, o banco público recebeu mais de R$ 500 bilhões em aportes do Tesouro Nacional, por meio da emissão de títulos públicos. Com o caixa reforçado, o banco selecionou algumas empresas para se tornarem gigantes do seu setor e competir no mercado internacional. Essa política ficou conhecida a de criar campeões nacionais. A partir de 2015, com a crise econômica e fiscal no Brasil, o governo se viu obrigado a iniciar a cobrança dos valores aportados para reduzir a dívida pública.
Foco em projetos de infraestrutura e concessões
O banco reduziu os empréstimos e agora se concentra na oferta de projetos de infraestrutura e concessões de serviços públicos.
O banco estima ter investimentos de R$ 250 bilhões em 120 projetos, dos quais R$ 80 bilhões já saíram do papel - entre eles, estão as concessões de 1.224 quilômetros de rodovias em São Paulo e dos sistemas de saneamento básico de Alagoas e Rio de Janeiro.
O governo federal, estados e municípios são autorizados por lei a contratar o BNDES para fazer projetos de infraestrutura, concessões e privatizações. Com isso, o banco estrutura os projetos e oferece empréstimos para financiar parte das obras.
Todo mundo conhece a parte de crédito do BNDES. A parte de serviços é algo que tem dado muito certo. O gargalo para atrair investidores e movimentar a economia é a falta de oportunidades bem estruturadas. Criamos esse conceito [de banco de serviços] para executar três trabalhos. Um é a estruturação de projetos. O outro é a articulação. Todos os atores precisam ser ouvidos, informados e considerados no projeto. O outro é conversar com os investidores. E já temos resultados positivos
Fábio Abrahão, diretor de Infraestrutura, Concessões e PPPs do BNDES
BNDES devolveu R$ 447 bi aos cofres públicos
A redução na concessão de crédito do BNDES coincide com a decisão dos governos Temer e Bolsonaro de acelerar o processo de devolução de recursos aportados no banco pelo Tesouro Nacional.
Desde 2015, a instituição financeira devolveu R$ 447 bilhões aos cofres públicos. Com menos dinheiro disponível no caixa da instituição financeira, menos empréstimos foram feitos nos anos seguintes.
Dinheiro havia sido usado após crise global de 2008
Após a crise econômica global de 2008, o banco socorreu diversas empresas e foi usado como instrumento para expandir a oferta de empréstimos para companhias.
A estatal intensificou a política de criar campeões nacionais, que consistia na seleção de empresas para se tornar gigantes em seus setores e competir no mercado internacional.
Para sustentar essa política, o governo emitiu mais de R$ 500 bilhões em títulos públicos, aumentou a dívida pública e repassou os recursos para o banco.
Com isso, as concessões de crédito dispararam. Em 2007, antes da crise, o banco concedeu R$ 133 bilhões em empréstimos. Em 2010, ano de maior desembolso da história, o valor mais que dobrou e chegou a R$ 294,8 bilhões.
Crise no Brasil secou fonte do dinheiro
Com a crise econômica e fiscal no Brasil a partir de 2015, o governo foi obrigado a cobrar a devolução desses recursos para amortizar a dívida pública.
Críticos da política de grandes empréstimos do BNDES também afirmam que o governo tinha enormes prejuízos com essas operações porque remunerava os títulos públicos com juros altos, enquanto as taxas cobradas pelo BNDES eram bem inferiores.
Procuradas, as assessorias dos ex-presidentes Luiz Inácio Lula da Silva, Dilma Rousseff e Michel Temer não se manifestaram.
Banco reforçará atuação na oferta de garantias
O diretor de Crédito e Garantia do BNDES, Petrônio Cançado, declarou que a queda da Selic (taxa básica de juros) mudou o mercado de crédito para financiar grandes projetos. A taxa passou de 14,25% ao ano em 2016 para 2% em 2020.
Antes dessa queda de juros, os demais bancos e investidores preferiam comprar títulos públicos do governo brasileiro a emprestar para empresas realizarem grandes projetos de infraestrutura. Aplicar nos papéis do Tesouro Nacional dava mais retorno, com menos risco.
Com a queda dos juros e a redução da rentabilidade dos títulos públicos, os bancos e investidores passaram a perceber oportunidades de retorno em financiar os projetos de infraestrutura. Com isso, também passaram a oferecer empréstimos para as obras.
Dessa forma, parte dos recursos é emprestado pela BNDES e outra parte por bancos e investidores.
Sem detalhar o valor, Cançado afirmou que em 2021 o banco deve emprestar mais que os R$ 65 bilhões concedidos no ano passado. O banco, entretanto, não voltará a emprestar os volumes registrados no passado.
Segundo ele, a estatal reforçará a atuação para estruturar fundos garantidores para que outros bancos ofereçam empréstimos.
Em 2020, R$ 93 bilhões foram emprestados a partir do Programa Emergencial de Acesso ao Crédito. O BNDES era responsável pelo Fundo Garantidor para Investimentos.
Por meio do programa, 47 instituições se habilitaram para oferecer empréstimos a micro, pequenas e médias empresas.
Esses valores não entram no balanço do banco como empréstimos feitos pelo BNDES, mas é uma atuação importante. A construção e execução desse projeto se deram por meio do banco. E cada vez mais teremos uma atuação importante nesses programas de garantia
Petrônio Cançado, diretor de Crédito e Garantia do BNDES
BNDES não criou valor para a sociedade, diz economista
A mudança no perfil do BNDES, com a função de estruturar projetos e dividir a oferta de empréstimos com outros bancos, é avaliada como positiva pelo economista Roberto Ellery, professor da UnB (Universidade de Brasília).
O papel do BNDES de estruturar projetos me parece uma função mais adequada. Com isso, muda aquela ideia de que o banco ia financiar o Brasil para o país ser grande. Economias grandes têm um mercado de crédito forte e competitivo. O BNDES inibia esse desenvolvimento porque tinha taxas artificialmente muito baixas. E quem paga essa conta é a sociedade, com endividamento público e menos dinheiro para ser investido em outras áreas
Roberto Ellery, economista e professor da UnB
Segundo ele, o banco foi usado politicamente e muitas empresas receberam financiamento não porque tinham os melhores projetos, mas porque alimentavam campanhas políticas.
Ellery declarou que a estratégia de criar campeões nacionais não elevou o nível de investimento público nem trouxe benefícios para a sociedade.
A ideia de que cabe ao governo financiar tudo é errada. Ele deve atuar unicamente onde o setor privado não enxerga oportunidades.
Roberto Ellery
Política de campões nacionais foi importante, diz economista
O economista Júlio Miragaya, ex-presidente do Conselho Federal de Economia, declarou que a política de criar campeões nacionais foi importante para o Brasil. Segundo ele, o país precisava de megaempresas para competir no mercado internacional.
A política de criar campeões nacionais foi adotada na Coreia do Sul, no Japão e Alemanha. Temos que lembrar que os Estados Unidos também injetaram bilhões de dólares na crise de 2008 para que Ford e GM não quebrassem. Elas só sobreviveram com apoio do governo
Júlio Miragaya, economista
Segundo ele, é papel do BNDES emprestar para grandes empresas, investir em infraestrutura e ofertar crédito para pequenas e médias.
BNDES reduz grandes empréstimos e agora dá consultoria para privatizações - UOL
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