A alta da Selic pela terceira vez consecutiva, ontem (16), não surpreendeu. A taxa básica de juros aumentou 0,75 ponto percentual, para 4,25% ao ano. Contudo, daqui para frente – o que importa para as decisões de investimentos – o Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central (BC) indicou que o ajuste total da Selic será maior do que o inicialmente pensado.
As aplicações de renda fixa, aquelas mais conservadoras, darão mais retorno. Consultores aconselham elevar a parcela desses investimentos na carteira, especialmente dos títulos atrelados à inflação. Por outro lado, a desigualdade entre o mundo dos investidores e dos consumidores vai ficar maior, porque o crédito vai encarecer.
Na semana anterior ao Copom, a maioria das 104 consultorias e instituições financeiras ouvidas pelo Valor esperava que a taxa básica de juros avançasse para 6% ou mais no final deste ano. É bom ficar de olho nas expectativas a partir de agora.
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Da última decisão do Banco Central para cá, dois dados essenciais mostraram em que pé o Brasil está e alimentaram a projeção de Selic mais elevada. Primeiro, foi o Produto Interno Bruto (PIB), indicador que mede o desempenho da economia do país, que subiu 1,2% no primeiro trimestre em comparação aos três meses anteriores e superou as estimativas.
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Depois, veio a inflação oficial do Brasil, que foi a maior para maio desde 1996 e também ficou acima do esperado. O Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) acelerou 0,83% no mês e 8,06% nos últimos 12 meses.
Em uma economia mais aquecida, as pessoas compram mais e acabam ajudando a aumentar os preços. Isso está acontecendo no mundo e preocupa consumidores e o mercado. Para controlar a inflação, o BC eleva a taxa básica de juros. Com esse avanço na Selic, o crédito encarece. No entanto, circula menos dinheiro e os preços são contidos.
Consultores afirmam que a subida da taxa básica de juros é um caminho em direção à normalidade. A discussão agora é até onde vai a alta, em uma hora em que as expectativas para PIB, inflação e Selic estão mudando rapidamente.
Renda fixa ganha força
Nesse cenário, a renda fixa começa a ganhar força. A mudança não deve ser grande, já que a Selic ainda está baixa em comparação ao que já foi. Porém, a atenção agora vai para os títulos atrelados à inflação, que oferecem uma taxa combinada na hora da aplicação mais o IPCA até a data de vencimento.
Esses papéis estão acessíveis nas corretoras como Tesouro IPCA, título do Tesouro Direto, ou CDBs indexados à inflação e outros papéis privados. O retorno deles é atrativo agora por dois motivos: o lado da taxa determinada no momento do investimento aumentou com a expectativa de alta de juros e a parte que é o IPCA também acelerou.
A inflação corrói o poder de compra dos consumidores, mas cria boa rentabilidade para os investidores. Além de aproveitar o bom retorno, a pessoa que compra esses títulos se protege da inflação ao longo dos anos, já que sempre ganhará uma taxa extra acima dela.
“Os títulos atrelados à inflação são a alternativa óbvia agora que a Selic ainda está em alta, vale a pena aumentar o investimento nessa classe. Você só não pode colocar todos os seus ovos nessa cesta, porque ela tem volatilidade tanto quanto as ações”, aconselha Sandra Blanco, consultora de investimentos da corretora Órama.
Em papéis indexados ao IPCA, as pessoas só podem contar com o rendimento combinado na hora da compra se mantiverem o dinheiro aplicado até a data de vencimento. Em caso de venda antecipada, os investidores podem acabar resgatando menos recursos do que investiram, se sacarem em um momento desfavorável.
Isso acontece porque o preço de venda do título é determinado pelo que o mercado está disposto a pagar naquela data, o que é chamado de marcação a mercado. Por esse motivo, é essencial alinhar o objetivo do investimento com o final do prazo do papel adquirido.
No Tesouro Direto, os títulos com final do prazo em 2026, os mais curtos, oferecem mais de 3% ao ano mais IPCA. Já os papéis com fim do prazo em 2055, os mais longos, oferecem mais de 4% ao ano mais inflação.
CDBs e outros títulos privados ofertam datas de vencimento menores e retornos mais altos, devido ao risco do banco emissor falir ser maior do que o do governo. Contudo, eles são cobertos pelo Fundo Garantidor de Créditos (FGC), espécie de seguro.
Blanco recomenda aos conservadores ter 15% da carteira investida em papéis indexados ao IPCA e, aos arrojados, 30%. Aos conservadores, ela também sugere prazos de até cinco anos, de menor risco. Entre os assuntos que podem trazer volatilidade aos títulos, a consultora cita as eleições no ano que vem, os desajustes nas contas do governo e o encaminhamento devagar das reformas.
“O cenário é de muitos riscos e é melhor ser mais cauteloso. No ano passado, havia esses riscos e não tinha para onde ir além da bolsa. Agora tem essa opção”, afirma.
Crédito privado
De acordo com Blanco, o crédito privado também ganha atratividade em meio à alta da Selic, mas é uma alternativa mais arriscada do que o Tesouro Direto e é difícil para os conservadores com pouco conhecimento achar os melhores títulos. Ela recomenda contar com uma consultoria ou escolher um fundo de crédito privado.
“Não vimos deterioração na qualidade de crédito e há boas oportunidades no crédito privado que vale a pena não deixar passar. Não é toda hora que isso acontece”, sugere.
Juro real em alta
Os títulos atrelados à Selic, como o Tesouro Selic, ou ao CDI (muito próximo à taxa básica de juros), como grande parte dos CDBs, ficaram com juro real negativo com a queda da Selic. No jargão econômico, o juro real é a diferença entre o rendimento das aplicações financeiras e a inflação, ou seja, é o ganho efetivo com os investimentos. Foi algo raro, que não acontecia há 30 anos.
Contudo, o juro real agora está em alta. Após o aumento da Selic ontem, o juro real esperado para os próximos 12 meses está em 1,92% ao ano, conforme cálculo da casa de investimentos Infinity Asset. A taxa está positiva desde março, de acordo com a conta da gestora. O Brasil ficou na segunda colocação no ranking mundial de juros reais, atrás da Turquia, segundo a Infinity. O estudo considera inflação projetada para os próximos 12 meses de 4,34%.
Com a alta da taxa básica de juros, essas aplicações financeiras que rendem a Selic ou o CDI, aconselhadas para a reserva de emergência por serem mais conservadoras, líquidas e seguras, voltarão a pagar mais.
Camilla Dolle, especialista de renda fixa da XP, aconselha escolher títulos de emissores conservadores para a reserva de emergência, como o Tesouro Selic, mesmo que os papéis de outros emissores ofereçam mais. A especialista afirma que tem visto menos opções de CDBs pagando bem acima do CDI.
Ela também contraindica papéis atrelados à inflação e crédito privado para a reserva de emergência, justamente por serem menos conservadores, líquidos e seguros. Esses investimentos são para serem alinhados com outros objetivos e resgatados no médio prazo, assim como os papéis prefixados, que oferecem uma taxa combinada na hora da aplicação se a pessoa sacar na data de vencimento.
“Ainda têm prêmios interessantes nos prefixados de prazo mais curto, tanto no Tesouro Direto quando nos títulos privados”, diz. Prefixados de prazo mais longo não são sugeridos agora, porque a Selic pode subir acima da taxa oferecida por eles.
Bolsa continua em alta
A busca por uma carteira de investimentos bem diversificada continua, sugerem consultores. “Ainda que siga em elevação durante as próximas reuniões, e isso muito provavelmente vai acontecer, é uma taxa baixa o suficiente para justificar a tomada de risco. O investidor continua tendo que olhar para alternativas de diversificação para obter retornos maiores”, aconselha José Mauro Delella, consultor econômico da Alta Vista Investimentos.
Ele explica que, com a economia andando mais rapidamente, o crescimento das companhias da bolsa tende a melhorar. “Eu estava mais preocupado com os preços dos ativos do que estou agora”, afirma. “As coisas estão menos incertas.” Com empresas mais sadias, a procura das pessoas pela bolsa e outras aplicações financeiras de renda variável não deve diminuir, conforme Delella.
A carteira de investimentos diversificada deve estar ajustada aos objetivos e ao perfil de cada pessoa, alerta Jayme Carvalho, conselheiro da Planejar, associação que certifica e reúne os planejadores financeiros. Assim, conservadores devem começar devagar na renda variável. Fundos multimercados de baixa volatilidade, em que um gestor escolhe os ativos, são um bom início para esse público.
Carvalho também destaca que é preciso ter uma visão de longo prazo, não embarcando na moda do momento, e evitar ajustes bruscos na carteira, que geram custos. “Faça uma carteira bem dividida e aproveite momentos para incrementar”, recomenda.
— Foto: GettyImages
Com a terceira alta da Selic, veja o que fazer com seus investimentos - Valor Investe
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