Ex-presidente do Banco Central diz que a autoridade monetária se equilibra em ‘gelo fino’ e não pode mais ‘desperdiçar munição’ na composição da alta de juros
A trajetória de alta da inflação brasileira deve mostrar sinais de arrefecimento nos próximos meses com a influência da queda na cotação do dólar, o aumento da taxa de juros e a expectativa de controle dos gastos públicos pelo governo federal, afirma Gustavo Loyola, presidente do Banco Central em duas oportunidades (1993/1992 e 1995/1997) e sócio da Tendências Consultoria Integrada. A prévia do Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), o medidor oficial da inflação, foi a 0,44% em maio, o maior valor em cinco anos, e acumulou alta de 7,27% nos últimos 12 meses. Em entrevista à Jovem Pan, Loyola diz que o pico inflacionário — impulsionado, principalmente, pelo choque dos alimentos e dos combustíveis com a disparada das commodities — já passou, mas a alta acumulada até aqui vai fazer com que o IPCA feche próximo ao teto da meta perseguida pelo BC, de 5,25%, com centro de 3,75% e piso de 2,25%. Pela previsão da Tendências, o IPCA vai encerrar o ano a 5%. “A inflação tem sido muito alta e, mesmo com as expectativas de que vá cair ao longo do segundo semestre, quando fechar o ano ela ainda ficará em um patamar elevado”, afirma.
O economista aponta a desvalorização do real ao longo do primeiro semestre como um dos principais catalizadores de pressões inflacionárias. A moeda norte-americana operou acima de R$ 5,50 entre o fim de fevereiro e abril — alcançando o pico de R$ 5,79 no início de março —, em meio aos entraves para a aprovação do Orçamento de 2021 e o agravamento da expectativa fiscal brasileira. “Quando o preço das commodities sobe, a moeda dos países produtores de commodities se valorizam, e o real estava atrasado”, diz Loyola. Na última sexta-feira, 4, o dólar encerrou cotado a R$ 5,03 — o menor patamar desde 12 de dezembro —, depois de acumular queda de 3,3% na semana. Desde o início do ano, o real valorizou 3% ante a divisa norte-americana. Segundo o ex-presidente do BC, a moeda brasileira chegou ao nível de normalização e deve se manter na faixa de R$ 5 e R$ 5,20 até o fim do ano — apesar de não serem descartadas rápidas passagens pela casa dos R$ 4. “O real recuperou o patamar onde deveria estar há algum tempo, e não estava em função das incertezas internas.”
O alívio inflacionário também passa pela política de aumento dos juros básicos pelo Banco Central, que alterou a Selic para 3,5% ao ano em maio e já indicou um novo aumento de 0,75 ponto percentual no encontro entre os dias 15 e 16 de junho, jogando o índice para 4,25%. Loyola espera que a taxa de juros feche o ano a 5,5%, — pouco abaixo do consenso de 5,75% do mercado financeiro — e afirma que a alta é necessária diante dos desafios causados pela inflação, mesmo que esse movimento signifique a redução da política de estímulos monetários adotada pelo BC para dar tração à retomada da economia. “O Banco Central está se equilibrando no gelo fino: de um lado, tem a ameaça inflacionária, e do outro, uma economia que está bastante enfraquecida, além da série de incertezas com a pandemia”, afirma. Segundo o ex-presidente da instituição, a autoridade monetária não tem mais espaço para cometer erros. “Tem que ter uma certa cautela no processo de alta de juros para evitar um resultado negativo na atividade econômica. Ou seja, o Banco Central não pode desperdiçar munição, ele tem que acertar a dose correta da alta de juros.”
O atual movimento do BC deve fazer com que a inflação volte para dentro da meta em 2022. A recente crise hídrica, que vai impactar diretamente no encarecimento da energia, representará uma pressão temporária, mas deve ser vista com atenção para não deixar que contamine as previsões. “O Banco Central começou a reagir, tanto que a gente vê uma certa melhora das expectativas olhando para 2022. Mesmo que as previsões sejam altas, elas já convergem para um número dentro da banda de tolerância das metas de inflação”, afirma o economista. A meta para o ano que vem é de 3,5%, podendo variar entre 2% e 5%. Pelas análises da Tendências, o IPCA encerrará 2022 em 3,7%.
Queda do dólar, alta dos juros e controle fiscal devem trazer alívio para a inflação, diz Gustavo Loyola - Jovem Pan
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